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O custo da desigualdade salarial entre homens e mulheres

Ana Carolina Seleme*

No ano passado, o Brasil aprovou a lei da igualdade salarial entre homens e mulheres. À primeira vista, a nova lei busca reduzir um problema histórico e garantir justiça social. Mas, não é só isso. A médio prazo, ela pode ser um fator importante para impulsionar a economia brasileira.

Isso porque o sexismo custa caro, algo que poucos percebem. A revista britânica The Economist estima que o PIB per capita da América Latina seria 16% maior se não houvesse disparidade salarial.

A Moody’s Analytics, que faz parte de um grupo conhecido mundialmente por suas análises de riscos, reforça essa conclusão. Segundo a empresa, reduzir a diferença de salários entre homens e mulheres pode impulsionar a economia global em cerca de 7% – o que representa algo como 7 bilhões de dólares. 

Salários iguais, portanto, significam mais dinheiro girando e, se considerarmos que as mulheres mundialmente têm maior grau de escolaridade que os homens, também um potencial aumento de produtividade nas empresas. 

No que diz respeito a cargos de liderança, os indicadores também pesam a favor das mulheres. 

Em 2019, a Organização Internacional do Trabalho (OIT) fez uma pesquisa com 13 mil empresas de 70 países. Para 75% delas, colocar lideranças femininas em cargos estratégicos contribuiu para o crescimento dos seus negócios. No Brasil, 451 empresas foram entrevistadas pela OIT e 71% delas afirmaram que seus lucros aumentaram de 5 a 15% com mulheres em cargos de direção e presidência. 

No entanto, segundo o IBGE, as mulheres brasileiras recebem salário 22% menor em comparação com homens na mesma posição e essa diferença chega a 34% em cargos de liderança.

Não é apenas a questão salarial que reflete a discriminação. O Censo 2022 também revela que, entre a população economicamente ativa, enquanto 63,3% dos homens estavam trabalhando, o indicador feminino era de 46,3%. A desigualdade também é grande entre os trabalhadores com ensino superior completo: 84,2% dos homens ocupados contra 73,7% das mulheres.

O ideal da equidade ainda está longe, já que as mulheres são maioria entre a população. Por isso, o país dá um passo importante com a aprovação de uma lei que torna obrigatória a equiparação de salários e de cargos.

Ainda que a igualdade salarial já estivesse prevista na CLT e na Constituição Federal, a nova lei traz avanços e endurece as regras. Ela estabelece mecanismos de transparência salarial, canais para denúncias, critérios remuneratórios e multa administrativa que pode chegar a 3% da folha de salários da empresa.

Com a transparência, vai ser possível comparar e ter uma visão real de salários, remunerações e a proporção de ocupação de cargos entre homens e mulheres. 

A iniciativa inclui o Brasil no grupo de economias mundiais que exigem a igualdade de remuneração por lei.

Na União Europeia, por exemplo, os esforços para reduzir essa distorção no mercado de trabalho também resultaram em normas mais exigentes. E focam na economia como um dos principais benefícios de medidas igualitárias.

As projeções são de que políticas de equiparação salarial, associadas a outras melhorias na igualdade de gênero, levariam a um aumento do PIB per capita da UE de até 9,6%, o que significa mais de 3,15 bilhões de euros. 

Para se ter uma ideia do impacto disso, ações na área da educação, no mesmo período, renderiam um aumento de 2,2% no PIB.

Para levar avante essas projeções, em março de 2023, o Parlamento da União Europeia aprovou padrões de transparência salarial que permitem checar a existência de disparidades por gênero. Os países devem impor multas a quem infringir as regras e os anúncios de vagas terão que ser neutros em gênero. 

Além disso, o Parlamento quer tornar mais fácil para as mulheres alcançarem cargos mais altos. Com mudanças nos regulamentos de recrutamento, a UE pretende que, até meados de 2026, pelo menos 33% dos cargos de direção sejam ocupados por mulheres. 

Nos Estados Unidos, a Equal Pay Act (Lei de Igualdade de Remuneração), é sexagenária. Ela foi aprovada em 1963. De lá pra cá, o salário das mulheres, que equivalia a 59% ao recebido pelos homens, subiu para 82%.  

Mas, apesar do avanço significativo, a desigualdade persiste.  A estimativa é que as mulheres americanas tenham perdido 61 trilhões de dólares desde 1967. 

Avançamos com a nova lei, mas é importante destacar que, além da desigualdade salarial, o Brasil precisa olhar o sexismo no mercado de trabalho em suas outras variantes, começando com o recrutamento e seleção de profissionais.

O Poder Judiciário tem ferramentas para ajudar. Em 2022, o TST e o Conselho Superior da Justiça do Trabalho (CSJT) criaram o Grupo de Trabalho em Estudos de Gênero, Raça e Equidade. Formado por 12 mulheres e um juiz, o grupo tem o objetivo de propor políticas e programas institucionais voltados à promoção da equidade e ao enfrentamento das discriminações no âmbito da Justiça do Trabalho.

Em meio a ações colocadas em prática pelo Brasil e em diversos países, vale lembrar que combater essa desigualdade sistêmica, que transcende fronteiras, é uma das metas dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), da ONU. A discriminação baseada em gênero, de acordo com o documento, dificulta o progresso no sentido de um mundo mais justo e equitativo. 

Com base em todas as pesquisas e indicadores sobre o tema, é possível dizer que a desigualdade também é uma barreira para a construção de economias mais sólidas e sociedades mais ricas. 

Ou seja, o sexismo não só é ruim e injustificável moral e eticamente. Ele causa prejuízos a todos.

*Ana Carolina Seleme é advogada, mediadora e dirige a Seleme Consulting. É gestora do maior acordo coletivo do Judiciário brasileiro.

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